Aos Latino-americanos.
O que fizeram teus deuses?
Enganaram-te?
América, raízes cortadas em espadas de pólvora
Ha! Verdes florestas plantadas de soja e mugidos de bois
Rios de mercúrio, areias, desertos de sal...
Na tua carne brota os sepulcros de milenares indígenas
O grito de Sepé, a arte revolucionária de Sandino, Martí, Mariguela, Juana Azurduy...
Tuas centenas de línguas assassinadas
A cerração cerrada em tuas montanhas de prata arrancadas pelas mãos do filho forçado em miragem de fome
Teus oceanos abertos à sina da bandeira encaveirada
Coberto teu solo por milhões de fantasmas
Teus domínios roubados pelos deuses do teu sonho antecederam tua revolta
Onde estarão teus filhos senão mostrando a face ao verdugo?
Às misérias nascidas do asco europeu e ianque
Teus sambaquis não se renovam...
Tua imagem se revela solitária ao espelho Titicaca
Teus quilombolas sobem morros, e cercados de fúria e medo se sustentam com fuzis apontados para o Mar da Guanabara
Teus camponeses lavram sanhas de fome em sesmarias tomadas por enclaves e solidões de pampa
Levaram teu guano, o salitre, teu cobre, profanaram teu corpo, teu túmulo...
Escravizaram teus filhos
Os nomes da África moldaram nos ferros!
Trouxeram seus corpos e banzos os deixaram ao chicote da loucura
Sonha tua liberdade América!
Nas Chiapas a terra orvalhada em mais um dia!
Dançam com o corpo pintado no Araguaia, no Amazonas quimeram fogueiras, no Putumaio acolhem o doce.
Voa nos olhos do puma ligeiro o aviso, em venenos de flechas o abraço da guerra acolhe invasores
Teus tambores ecoam
A cor antiga da tua liberdade voa nas asas do condor
A marca de uma mão ensanguentada veio a ti oferecendo a morte vestida de batinas e canhões.
Cordilheiras de neve debruçam tua face em teu seio de águas rubras de sangue, negras de mangue, amarelas de ouro, cristalinas de pureza e prata.
Açoites em tua pele coroada de selvas
Andes, Antilhas, Galápagos...
Trópico e geleiras coabitando desertos, caatingas, campos, pedras que se elevam ao cume do Aconcágua
O grito da fauna, o marulhar das águas, as vozes das ruas cheias de sol das tuas metrópoles
O sonho roubado da tua pele carcomida em lamentos
Os meteoros de máquinas a roer o teu seio
Terra do Fogo!
Cavernas de antigos caçadores patagônios, paraíso de gelo e pedras
Árvore que cai aos meus olhos...
Caríssima América!
Te tenho pura em meus braços de amor.
- Odilon Machado de Lourenço,
querido poeta da garrafa
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